- Cotidiano em Crônicas
O dia seguinte
O dia seguinte é quando os verbos começam a ser conjugados no passado.
O dia seguinte é quando a realidade bate à porta como se dissesse “esta é a sua nova vida”.
E é uma vida em tons de cinza, mesmo que o sol esteja ali brilhando, contrastando com a tristeza no peito, quase uma ofensa.
É no dia seguinte que se percebe que ao mesmo tempo em que tudo acabou, tudo recomeça, mesmo que não se deseje mais participar.
O dia seguinte é como um véu que desce e turva a visão porque tudo passa a ser embaçado.
E no dia seguinte nem sequer há o consolo das lágrimas porque todas já foram derramadas.
No dia seguinte se descobre a solidão e sua intensidade.
E tenta-se, em vão, recordar de Drummond, para que seus ombros suportem o peso do mundo e que a vida seja uma ordem.
As palavras tornam-se inúteis porque nenhuma delas reflete o que se pensa e se sente.
No dia seguinte lembra-se de coisas pueris, para as quais se busca um sentido.
Tudo parece artificial, irreal e menos importante do que era no dia anterior.
E no dia seguinte passa-se a esperar por algo que não se sabe bem o que é e nem quando ou se virá.
E é no dia seguinte que se descobre o que significa nunca mais. E nunca mais é tempo demais.
